domingo, 5 de dezembro de 2010

Madrid, ponto de passagem

[Hotel Room, 1931 - Edward Hopper]



Estive de novo em Madrid. Madrid é uma cidade enorme rodeada de auto-estradas de circunvalação recheadas de tentáculos cujo negrume alcatroado a liga aos mais diferentes pontos da Espanha. Madrid não tem mar como outras grandes cidades mundiais, mas tem um enorme aeroporto internacional que a une às outras grandes urbes espanholas e ao mundo inteiro e é ainda ponto de partida e chegada para uma enorme rede de comboios de alta velocidade que percorre todo o país de Cervantes.

Atocha, La Castellana, Cibelles, Moncloa, Prado, são, entre tantas outras, marcas indissociáveis da cidade. Mas existe em Madrid um museu que também faz parte dos roteiros obrigatórios da cidade embora me pareça passar um pouco despercebido. É um espaço cultural que merece uma visita bem atenta às suas enormes galerias e dá pelo nome de Thyssen Bornemisza. Voltei lá nesta curta visita e pude observar expostas algumas das maiores expressões de criatividade da pintura mundial desde Degas a Miró, de Picasso a Monet, de Velásquez a Van Gogh e muitos outros grandes nomes da pintura mundial e suas várias tendências artísticas.
Apesar disso, há quadros que sabemos existirem no Thyssen Bornemisza mas cuja presença por lá continua a surpreender-nos quando nos deparamos com eles. Um é famosíssimo, pertence ao americano Edward Hopper, pintor por excelência da solidão urbana, e retrata uma mulher só num quarto de hotel, com as malas – supõe-se – ainda meio por desfazer (Hotel Room, 1931). Mas, ao mesmo tempo que me surpreendo com a visão do original da pintura por ali, fica a pairar em mim a forte sensação de que não haverá melhor quadro para descrever a impressão que me invade de cada vez que visito Madrid.

É que ao contrário de Paris, Roma ou Londres, exemplos não ao acaso de outras três grandes cidades europeias, em Madrid parece sentirmos sempre que estamos lá de passagem. E se em Paris, Londres ou Roma nos apetece desfazer as malas, ficar por ali, envolver-nos na multidão, tornarmo-nos um deles, em Madrid já não. A mala fica por desfazer e vamos usando o estritamente necessário da bagagem que nos acompanha por não conseguirmos esquecer que vamos – e queremos - partir. E mesmo de visita a um outro famoso museu, o Centro de Arte Rainha Dª Sofia, perante uma outra obra incontornável da cultura global, a Guernica, de Picasso, não conseguimos desenvencilhar-nos da sensação de solidão que nos transmite Madrid e que o quadro de Hopper tão bem expressa.

Afinal, talvez «Hotel Room» de Edward Hopper esteja no local certo: a imensa cidade de Madrid que nos envolve e impressiona na sua grandeza mas não nos conquista afectivamente. Falo por mim, claro.

6 comentários:

Rubi disse...

Não terá sido por ir sozinho JL? Também gosto muito de Miró, Van Gogh e Velásquez. Há cidades a que não nos conseguimos ligar, nem elas se ligam a nós. Concordo em absoluto no que diz que Londres, ainda hoje escrevi algures que o que gosto de Londres é que é uma cidade que não acaba... Beijos

JL disse...

A propósito dessa coisa de ter ido sozinho, Rubi [eu disse que tinha ido sozinho? :)], caso ainda fosse vivo seria Edward Hopper a pintar-me o retrato. Afinal não era ele o 'poeta' da solidão? :)

Beijos.

P.S. - A que devo a deferência do tratamento por 'você'? :)

redonda disse...

Quando fui a Madrid não senti isso. Pareceu-me que havia muito para ver e que os Museus até estavam próximos e dava para ir a pé e achei incrível que com todo o frio, tantas mulheres se produzissem para sair à noite muito despidas :)

Rubi disse...

LOL Boa, muito boa resposta...!

JL disse...

Redonda,acho que estou muito sozinho neste meu sentimento por Madrid. Mas não creio que seja apenas por Madrid,é um pouco por toda a Espanha. Não sei bem porquê,em Espanha nunca me senti em casa. :) Beijinhos.

JL disse...

Obrigado,Rubi. Tenho sempre a sensação de vos dar respostas tolas aos vossos comentários. E esta a que te referes era mais uma. :) Beijos.