terça-feira, 6 de abril de 2010

Peixe Lua






Amar na Planície


 «Peixe Lua», rodado em 1999 e com realização de José Álvaro de Morais, entretanto já falecido, é um filme onde se observam algumas virtudes inovadoras para a altura e alguns velhos defeitos dentro do panorama cinematográfico português e europeu. Destaque-se a beleza da fotografia muito poética com imagens belíssimas do sul da Península Ibérica, o esforço de mostrar cenários e costumes de alguma aristocracia rural e o trabalho de casting onde se tentou atribuir uma presença física adequada a cada perfil psicológico das diversas personagens. O negativo esteve na incapacidade de fugir a tentativas óbvias de estabelecer um paralelo artístico e erudito àquilo que afinal apenas necessitaria provar não passar do relato romanceado em filme de um estilo de vida, de uma forma de vida, do vulgar deslize e triunfo de comportamentos de pessoas normais. E o facto de se agarrar à obra de Garcia Lorca, talvez tenha provocado com que as personagens descambassem para uma homossexualidade que é latente em várias delas mas que nunca foi assumida por duas, o tio e Zé Maria. Isto, apesar do lema do argumento descambar, declaradamente no meu ponto de vista, para a demonstração pura e simples de algo muito próximo ao velho ditame do "não é carne nem é peixe.

Ainda assim, exceptuando algumas fases mais monótonas e dispensáveis para a trama, estamos na presença de um filme agradável. Beatriz Batarda, aqui no início de carreira e a actriz que protagoniza João [que é a força motriz do drama que se desenvolve], mostra-se uma mulher extremamente sensual e uma actriz já então muito competente. Pode até dizer-se que Beatriz é a mulher certa para o papel de uma jovem apaixonadamente confusa, sedutoramente rebelde e carismática q.b. para cabeça de cartaz. Marcello Urgeghe e Luís Miguel Cintra cumprem sem reparos mas Isabel Ruth está alguns furos acima dos dois. Já Ricardo Aibéo tem uma actuação muito pouco conseguida, demasiado teatral numa presença física muito pouco segura e com tão pouco à-vontade que parece carregar o mundo inteiro nas suas costas. 

Como curiosidade, diga-se que grande parte do filme foi rodado em Alcochete, uma vila pictórica bem perto de Lisboa, na margem sul do Tejo. O edifício da residência e talho de Gabriel possuíam no filme os números de polícia 17 e 18 o que coincidia na altura com a realidade do edifício situado na praça central denominada de S.João, apesar de nunca por lá ter existido um talho. Quanto à varanda do edifício onde uma senhora vastas vezes se assoma respondendo à chamada de Gabriel, é exactamente como aparece no filme e, ao lado, a Confeitaria Popular também existe. Já a estátua de um famoso médico que aparece nas filmagens junto a uma igreja em frente ao rio e pertencente a um familiar de João, como seria de esperar nunca saiu do mundo da ficção. 

«Peixe Lua», de José Álvaro de Morais, com Beatriz Batarda e Marcello Urgeghe