sábado, 3 de dezembro de 2011

Melancolia






O apocalipse segundo Lars von Trier, Capítulo Terceiro

Cada vez que se fala de Lars von Trier é inevitável falar-se de Dogma 95 e da forma como, em parceria com Thomas Vinterberg, o realizador dinamarquês buscou uma nova reinvenção do cinema a partir exactamente das suas bases negando toda a nova tecnologia associada. No entanto, é inútil manter este discurso já que a depressão em que caiu o próprio Lars von Trier se estendeu ao seu cinema de uma forma que chega a ser penosa para o espectador. Foi assim com «Dogville» [2003], o mesmo se passou com «Anticristo» [2009] e acontece agora com este «Melancolia» [2011]. De facto, o mais recente filme do homem que nos deu, entre outros, «Ondas de Paixão» [1996] e «Dancer in the Dark» [2000] não passa de um exercício inútil de querer pensar as pessoas, a sociedade e o próprio mundo através de um cenário apocalíptico que arrasa tudo sem deixar rasto de nada. A acumular, o facto de muito pouco do que contem esta visão negativista de Lars von Trier da realidade que o rodeia constituir qualquer novidade para os amantes de cinema. Talvez a descoberta de um novo planeta no firmamento.
O filme até possui um elenco invejável onde pontificam Kirsten Dunst, a mulher que no filme personifica um estado tal de depressão que não só seca tudo à sua volta como é inútil qualquer antídoto que vise a sua cura, Charlotte Gainsbourg e Kiefer Sutherland a par de nomes incontornáveis da representação como Charlotte Rampling, John Hurt e Stellan Skarsgärd. Mas em vez de dar credibilidade a «Melancolia» este pormenor do casting só acarreta uma carga negativa ainda maior já que defendendo personagens sem qualquer espessura dramática, na maior parte dos casos, e de um dramatismo exagerado ou desfasado, noutros casos, faz com que os actores acabem por se afundar com o filme enquanto o espectador vai procurando inutilmente uma ponta de racionalidade onde os critérios lógicos são inexistentes. Dir-se-á que essa pode ser uma característica das grandes obras de arte mas eu acredito que em cinema a discussão não pode nunca ser apenas a qualidade ou não do filme em si mas sim o que este debate. E a par da questão ligada à razão, a emoção não só necessita ser posta à prova como a narrativa deve conter atributos que prendam o espectador à tela. E para mim nada disso acontece em «Melancholia» que é, afinal, um planeta que vem destruir outro planeta, o nosso.
Por tudo isto, é também quase uma fatalidade comparar-se esta obra a «A Árvore da Vida», de Terrence Malick. E aí, pese a excelente música de Richard Wagner em «Melancolia», há toda uma dimensão poética e filosófica aliada a uma certa serenidade ligada à própria concepção do filme que abafa completamente este estado anímico depressivo em que (sobre)vive o cinema do tal realizador que um dia criou um movimento chamado Dogma 95: luz natural, câmara às costas, ausência de efeitos especiais e amor pelo cinema. Velhos tempos, águas passadas, há que o dizer.

«Melancholia», de Lars von Trier, com Kirsten Dunst, Charlotte Gainsbourg e Kiefer Sutherland

2 comentários:

redonda disse...

Ainda não decidi se vou ou não tentar ir vê-lo...

JL disse...

O que posso dizer-te, Gábi, é que «Melancolia» acabou de ser eleito o Melhor Filme Europeu do Ano pela Academia Europeia de Cinema. Mas isso não retira nem uma vírgula àquilo que escrevi...:)