segunda-feira, 18 de julho de 2011

Pequenas Mentiras Entre Amigos






Sexo, Mentiras e Vídeo

Eles são um grupo de amigos entre os trinta e os quarenta anos. Uns vivem relacionamentos que já conheceram melhores dias, outros são casados e até têm filhos. São gente realizada profissionalmente e há entre eles médicos, actores e um empresário hoteleiro muito bem sucedido. O filme começa por acompanhar um deles numa noite de diversão, copos e alguma droga. Mas Ludo [Jean Dujardin] abandona a discoteca onde se encontra, pega no seu motociclo e percorre as ruas desertas na madrugada de Paris até ter um acidente que o deixa desfigurado e em coma nas vésperas de ir de férias com os amigos para o sul de França. Sem visitas e sem que pudessem fazer algo pelo amigo, Marie [Marion Cotillard], Vincent [Benoît Magimel], Eric [Gilles Lelouche], Antoine [Laurent Lafitte] & companheiros decidem manter de pé o projecto de férias na casa do mais abastado do grupo, Max [François Cluzet], hoteleiro de profissão e talentoso exibicionista. E é então que entre ‘flirts’ vários, jogos de praia, visionamentos de vídeos de férias de anos passados, lautos almoços e ainda maiores jantaradas que o grupo se vai revelar.
Para quem viu o filme «A Última Noite» e se recorda do rapaz francês de bom trato que é apaixonado pela personagem de Keira Knightley, acaba de descobrir o argumentista e realizador deste «Pequenas Mentiras entre Amigos». Isso mesmo, Guillaume Canet, um dos mais prestigiados actores franceses da nova geração, assina este filme maravilhoso onde o espectador se deve preparar para o melhor e para o pior. Ou seja, para rir muito e chorar ainda mais. Aliás, nem é de estranhar: não é por acaso desta matéria que se faz afinal a vida? E apesar de se reconhecer no filme alguns excessos sentimentais e uns minutos que poderiam ser poupados na montagem, a verdade, meus caros, é que esta é a melhor proposta de cinema actualmente em exibição nas salas para quem gosta de celebrar a vida através da 7ª arte.
E «Les Petits Mouchoirs», no seu título original, é muito mais que um exercício de entretenimento puro já que exerce uma crítica bastante dura a uma certa burguesia que vive embrenhada num jogo de aparências tal que aquilo que importa unicamente é mostrar. Mostrar bens materiais, mostrar bons relacionamentos de amizade e de índole diversa e, ‘last but not least’, aparentar felicidade. O pior é quando à noite as luzes se apagam, o escuro convida à reflexão e o silêncio da noite leva a que se tenha sobre os actos praticados uma lucidez que torna tudo tão verdadeiro quanto atroz. Nesses momentos não há hipocrisia que valha e aqueles que durante o dia se entretêm no mentiroso jogo da felicidade caem então num naufrágio emocional que demonstra não apenas a sua fragilidade como a desorientação de que são vítimas. Apesar disso, o filme de Guillaume Canet, que tem um leve registo autobiográfico, mostra como pode ser tão falsa aquela frase que nos diz que os amigos são para as ocasiões. Pelo contrário, a acreditarmos no filme este prova que na amizade o sentimento que mais predomina é o egoísmo. Claro que é duro dizê-lo e muito mais reconhecê-lo, mas o facto é que as acções deste grupo de amigos a cultivarem a mais pura infantilidade emocional e racional parece estar tão perto de nós que quase nos faz querer afundar no sofá da sala de cinema como se também nos coubesse alguma culpa pelo que sucede na tela.
Para além da estrutura narrativa simples num filme com uma profundidade psicossocial que à partida estamos longe de imaginar, há ainda dois destaques a fazer: a extraordinária banda sonora, tão agradável quanto apropriada, e a excelência de um argumento onde cada personagem faz esquecer inteiramente o actor/actriz que a defende. Com uma excepção, claro: a que se refere aos olhos lindos e sorriso meigo e triste de Marie, directamente saídos da beleza de Marion Cotillard.
Finalizando, há que não esquecer: «Pequenas Mentiras entre Amigos» é o cinema como celebração da vida e um filme a não perder.


«Les Petits Mouchoirs», de Guillaume Canet, com Marion Cotillard, Benoît Magimel, Gilles Lelouche, Laurent Lafitte e François Cluzet


4 comentários:

Rubi disse...

Quando comecei a ler lembrei-me do filme 'Peter's Friends', com Stephen Fry e Emma Thompson, ha' qualquer coisa aqui que se encaixa nessa pelicula dos anos 90. Mas avancando percebi que a abordagem e' mais densa e muito interessante, quero ver sim. E nao sera' quase sempre assim quando se apagam as luzes? Alias, o facebook espelha umas vidas pseudo-perfeitas que me repugnam. Beijos

JL disse...

De facto, Rubi, quer a temática quer o tipo de abordagem deste filme não são originais e o filme mais popular que o fez é «Os Amigos de Alex» que Lawrence Kasdan realizou em 1983 [«Os Amigos de Peter», de 1992, é a sua versão britânica]. Mas isso não retira qualquer mérito à realização de Guillaume Canet e a um filme a todos os títulos admirável. Já quanto ao ‘Facebook’, o mínimo que posso dizer é que tentei nunca ver aquilo que ele reflecte como a realidade da vida das pessoas. E o problema maior, quer do ‘Facebook’ quer da Internet na sua generalidade, acontece quando algumas pessoas se vêem obrigadas a voltar à vida real. O choque pode ser traumático. Beijos.

l00ker disse...

voltei ao post, depois de o ver e devo dizer que mais uma vez fazes jus à grandeza do filme. "O pior é quando à noite as luzes se apagam, o escuro convida à reflexão e o silêncio da noite...".

Parabéns Joaquim :) os anos passam, mas o jeito mantém-se! Que 2012 nos traga ainda mais filmes como este, que como bem dizes, celebram a vida através da 7ª arte. ;)

JL disse...

Um abraço, Nuno. :)