quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

A homilia

[Folles Amours, montagem fotográfica de Lucien Clergue, o 'poeta da fotografia']






Em «A Dúvida» [filme de 2008], numa das suas fantásticas homilias o padre Flynn [Philip Seymour Hoffman] conta a história de uma mulher que tendo lançado um boato desprezível sobre alguém acaba por se arrepender e busca o perdão junto do padre seu confessor. O padre não lhe concede de imediato o perdão e instiga-a a subir ao telhado da casa onde habita com uma almofada de penas numa mão e uma faca na outra com o objectivo de rasgar o travesseiro ao vento. Quando a mulher regressa ao confessionário e lhe dá conta da missão cumprida, o padre não a perdoa desde logo optando por perguntar o que lhe restou do gesto. Uma imensidão de penas, responde-lhe pesarosamente a pecadora. E perante a nova missão de que o padre a encarrega, a de voltar ao local e apanhar todas as penas, a desconsolada mulher responde-lhe que isso é impraticável já que estas se espalharam de tal modo que não é de todo possível reverter o mal feito.
Hoje lembrei-me do padre Flynn e da sua homilia. Porque os fins não justificam os meios e a intolerância, a incapacidade de perdoar e, por que não dizê-lo, a maldade não podem nunca sobreviver a coberto da sensação de impunidade reinante numa sociedade que há muito perdeu a noção do bom senso.






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