domingo, 30 de janeiro de 2011

Biutiful






O elogio da dor

«Biutiful» é, antes de mais, a história de um homem que vive à beira do precipício. O mundo de Uxbal (Javier Bardem) é pesado, feio, doloroso e o novo filme de Alejandro González Iñarritu torna-se desse modo desaconselhável não pela sua incontestável qualidade cinematográfica mas porque a história que nos conta é de tal forma um hino à dor, à agonia, que facilmente leva o espectador ao desespero e ao cansaço pelo negativismo visceral ensaiado nas maleitas da natureza humana inseridas numa sociedade desigual que gera a mais repugnante miséria.
Uxbal, um Bardem inexcedível física e emocionalmente numa entrega fantástica ao perfil penoso da sua personagem, é um homem que perdeu a mãe quando criança e não chegou sequer a conhecer o pai. Tem ainda uma ex-mulher massagista, prostituta, alcoólica e bipolar incapaz de tomar conta dos dois pequenos filhos de ambos já que a ele, Uxbal, lhe resta muito pouco tempo de vida por sofrer de uma grave doença cancerosa. Uxbal, um estranho na sua própria terra, ganha a vida entre a máfia chinesa e os africanos ilegais que traficam todo o tipo de artigos nas ruas de Barcelona. Acrescente-se também que a Barcelona de Iñárritu é pobre e suja, dificilmente reconhecível e, inicialmente, pode até ser confundida com qualquer cidade oriental ou sul-americana no pior que estas grandes urbes com população em excesso podem apresentar.
E a verdade é que o filme vive da omnipresença de Javier Bardem, não apenas porque segue quase em exclusivo a sua personagem mas por razão da fantástica prestação do melhor actor espanhol da actualidade. Daqui se depreende que o realizador mexicano abandonou as histórias em mosaico e as montagens vertiginosas, seguindo uma linha temporal única e bem definida. Apesar disso, não se tornou mais fácil para o espectador seguir uma narrativa que, como se pode perceber, faz da dor uma única linha de raciocínio apresentando-a, à dor, em sentido literal e metafórico, ao centro, à esquerda e à direita, aqui, ali e acolá. E se numa pretensa busca de redenção para os seus pecados Uxbal demonstra uma humanidade admirável para quem busca o sustento na exploração do seu semelhante tendo ainda uma relação afectiva muito forte com os seus dois filhos, a verdade é que por seu lado o mundo de Alejandro González Iñárritu precisa rapidamente de mostrar alguma crença no ser humano. Sob pena dos seus espectadores se cansarem de constantemente serem vergastados emocionalmente pelo seu cinema.

«Biutiful», de Alejandro González Iñárritu, com Javier Bardem




2 comentários:

redonda disse...

Vi imagens do filme e pareceu-me interessante, sobretudo pelo que viria depois da tempestade.
Entretanto, li uma crítica num jornal e agora o que escreveste, e já não sei se quererei ir vê-lo....
beijinho

JL disse...

Vai ver, Gábi. Só assim, como ambos sabemos, poderás ter a tua própria opinião. Se te decidires a ir, boa sorte. :)

Beijinho.