domingo, 31 de outubro de 2010

Estado de Guerra











Jogos de Guerra





«Estado de Guerra» está nomeado para nove estatuetas da Academia de Hollywood e tem recebido, por parte da crítica, os mais rasgados elogios. Na verdade, para quem aprecie uma abordagem à temática da guerra focando-se na tensão própria dos militares em combate ou nas suas acções diárias de sobrevivência numa terra hostil, este talvez seja o filme indicado. Mas se, por um lado, «The Hurt Locker», no seu título original, apresenta uma visão despolitizada do conflito onde uns procuram apenas salvar as vidas que outros querem ceifar, por outro nunca se coloca a questão de tentar perceber porque foram afastados das suas famílias e viajaram para uma terra inóspita e longínqua onde a única coisa que lhes interessa é terminar vivos o tempo da missão que lhes foi dada. Bom, nem a todos já que o Sargento William Jones (aqui sim, uma fabulosa interpretação de Jeremy Renner) surge como o elemento que comprova como os efeitos da adrenalina da guerra se podem tornar numa droga e num vício difícil de largar.



As referências cinematográficas são sempre bem-vindas e as cenas de tiroteio no deserto iraquiano entre as tropas americanas e os indígenas insurrectos procuram a associação óbvia aos ‘western’ de outros tempos e evocam a memória das terras onde a lei era imposta a tiro. «Estado de Guerra» não se fica apenas pelos tiros já que os meios e as armas são muitíssimo mais sofisticados e o filme acompanha uma equipa especializada no desmantelamento de explosivos. Toda a tensão e adrenalina da narrativa giram em volta do já referido Sargento W. Jones, um militar temerário muito próximo do suicida, e do antagonismo com o seu companheiro, o também Sargento Sanborn (Anthony Mackie), que se vale das regras e dos ensinamentos colhidos para tentar salvar a pele. Pelo meio, há ainda um soldado, Owen Eldridge (Brian Geraghty), que faz o papel de ingénuo dividido na admiração pela coragem louca de um e pelo extremo bom senso do outro.



Neste mundo caótico e de uma certa irreversibilidade do homem preso à sua natureza, quer seja ele militar americano ou terrorista iraquiano, resulta um filme desenhado com mão firme mas onde a psicologia auto-destrutiva que lhe está inerente não consegue soltar-se do carácter mecânico da acção de homens como meros peões numa guerra que nem sequer procuram compreender. Daqui resulta uma trama sem emoção para o espectador a não ser, como já referido, na corporização de Jeremy Renner de um militar irremediavelmente seduzido pela adrenalina da guerra. E essa é a mensagem maior do filme de Kathryn Bigelow, a dos militares como grandes vítimas do absurdo da guerra. Enfim, é uma visão entre muitas outras mas que no entanto não escapa ao carácter extremamente redutor da tese que defende. E o ritmo seguro da acção aliado a um certo desencanto das personagens não são suficientes para me fazerem admirar sobremaneira um filme onde a tensão se sobrepõe à emoção. Talvez temendo isso ainda durante a sua produção, a realização socorreu-se dos nomes de Guy Pearce, Ralph Fiennes e David Morse como chamariz para as bilheteiras das salas de cinema. Escusadamente, já que qualquer um dos três actores foi dar apenas o pontapé de saída sem ter participado activamente no jogo.







«The Hurt Locker», de Kathryn Bigelow, com Jeremy Renner, Anthony Mackie e Brian Geraghty

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