domingo, 31 de outubro de 2010

Ficheiros Secretos: Quero Acreditar




Melodrama Sensaborão



Lembram-se? A série televisiva «X Files» entrou de rompante em nossas casas tornando-se um sucesso imediato. Daí até à sua chegada ao cinema em 1998 com «Ficheiros Secretos: O Filme» foi o evoluir de todo um processo natural que, à partida, tenderia a funcionar como uma espécie de aperfeiçoamento narrativo de um universo do agrado de espectadores de todo o mundo. No entanto, com a chegada de «Ficheiros Secretos: Quero Acreditar» à tela grande do cinema, creio que se matou de vez o que afinal já há muito agonizava. Terá o universo de Fox Mulder e Scully deixado de se tornar interessante relativamente à sua actividade como agentes especiais do FBI? Se assim for, faça-se, a partir de agora, um filme sobre a paixão entre as duas personagens principais, os seus encontros e desencontros afectivos, os seus novos desafios profissionais ou outra qualquer temática ligada ao par mas perceba-se de uma vez que o funeral de «X Files» já foi realizado. Quando? Em 2008, por Chris Carter neste «The X Files: I Want to Believe» (no seu título original).



Se o filme é decepcionante para os amantes da série televisiva, em que me incluo, imagino que se torne um pouco intrigante para aqueles que por ventura nunca acompanharam os episódios televisivos. É que, em boa verdade, esta fita não é mais que um banal e convencional episódio televisivo – embora mais alargado - e levanta a questão sobre saber onde reside afinal o segredo de um projecto televisivo de sucesso como o foi «X Files». Na verdade, comparada a este insípido drama de trama de complexidade muito duvidosa e completamente fora de moda no thriller psicológico que ensaia, ainda para mais sem capacidade de prender os espectadores à tela, «X Files», a série, está anos-luz à frente do filme. A todos os níveis.



Passe-se um pouquinho a vista pelo enredo e tente perceber-se do que se fala: toda a vertente psicológica e mais enigmática do filme – o grande trunfo da série – se prende com as visões de um padre que, valha-nos Deus, é um antigo pedófilo em expiação. Por outro lado, enquanto Mulder está retirado em penitência das lides, Scully é médica num hospital e deposita toda a fé na cura de um doente que, atente-se, a igreja quer pura e simplesmente deixar morrer já que não acredita na cura para a sua doença – valha-nos novamente Deus. Mas não é só já que andam a desaparecer misteriosamente mulheres e vem a perceber-se (atenção a quem ainda não viu o filme) que os confusos e estranhos maus da fita não vieram de Marte, Plutão ou outra Galáxia distante mas sim da Rússia. Ou de lá perto. Que Deus lhes perdoe ou castigue. A argumentistas, realizador e produtores que os actores são meros operacionais das fitas.



Note-se ainda o carácter irónico da coisa: num filme que tem muito de religioso no sentido de devoção à série, eis que a religião assume aqui um carácter fulcral no sentido mais negativista. Curiosamente, o melhor do filme, num argumento pobre e simplista, é a interpretação de Billy Connoly como o tal padre pedófilo e visionário que até chora lágrimas de sangue. Em suma, também um tanto ou quanto ironicamente, não só não se extraiu o melhor do espírito da série como o filme acaba por não ter qualquer significado dramático se a esquecer. Caricato. Resta-nos vibrar com a possibilidade inventariada de Mulder e Scully finalmente poderem vir a materializar o seu sonho de amor. Mas, desgraçadamente, isso não invalida que com este filme não corramos o risco de cair do alto do fervor místico relativamente à série «X Files» para a condição de meros gentios sem fé nem confiança. Uma lástima.



«Ficheiros Secretos: Quero Acreditar», de Chris Carter, com David Duchovny, Gillian Anderson, Billy Connoly e Amanda Peet

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