domingo, 31 de outubro de 2010

Uma Família Moderna




Jogo de aparências

Quando Tommaso diz a Alba, a sua amiga de infância, que ‘os amores impossíveis são aqueles que duram para sempre’ não está apenas a dar eco a uma convicção da personagem. De facto, é a própria essência de Ferzan Ozpetek que se evidencia através do pensamento da personagem principal de «Uma Família Moderna», o mais recente filme do realizador italiano [turco de nascimento]. Ozpetek [ele que dirigiu em 2003 «A Janela em Frente»] acredita na imortalidade dos afectos e é um clássico que permanece fiel à temática principal das suas obras: a homossexualidade e, já agora, fazer do instinto o melhor instrumento para atingir a felicidade.

A história do filme conta-se em breves palavras. Um jovem oriundo de uma família abastada de Lecce [sul de Itália], regressa de Roma onde supostamente estudou Gestão para revelar duas coisas à família: uma que é homossexual e a outra que estudou literatura porque o seu grande sonho é ser escritor e que jamais pretendeu continuar o negócio da família. Para isso vai ter de enfrentar um pai homofóbico e uma cidade prepotente nas suas relações presa ao convencionalismo típico de uma povoação de província. Mas pese o facto de estarmos aparentemente perante o retrato fiel de uma família tradicional, Ozpetek constrói uma divertida teia de enganos e o bom do Tommaso [Ricardo Scarmacio] vai ter que alterar os seus planos vítima de acontecimentos inesperados.

Aquilo a que se assiste a partir desta premissa do guião, é a um filme que dificilmente deixará de tocar emocionalmente o espectador. O conflito entre a modernidade e a tradição enquadra-se perfeitamente em personagens que anseiam manter-se fiéis aos seus princípios de sempre mas que se recusam a fechar os seus corações àqueles que amam e cujo sangue lhe corre nas veias. Pelo meio há ainda uma avó extremamente sagaz numa sabedoria que parece ter sido colhida do grande amor que não viveu mas que manteve aceso dentro de si por toda uma vida e uma jovem mulher, Alba [Nicole Grimaudo], irresistivelmente sedutora na sua beleza física, na personalidade rebelde e no modo sensível e solitário com que parece dar asas ao seu carácter extrovertido.

E é assim, com sensibilidade e ironia, que «Mine Vaganti» [no seu título original] se vai construindo e ganhando a batalha da emoção alheio a algum convencionalismo no modo como a realização parece olhar a questão das diferenças na orientação sexual dos homens e das mulheres. Este pormenor está patente sobretudo nas personagens quase caricaturais dos amigos de Tommaso, mas há que reconhecer que o respeito pelas regras dramáticas de um género pode levar a este tipo de rigidez por parte da realização. No entanto, o pormenor é de imediato desculpável quando se percebe que Ozpetek jamais receou cair no excesso quando fazia sentido seguir por essa via. E o que é indiscutível, e verdadeiramente importante, é que «Uma Família Moderna» é não apenas um filme tão divertido quanto emotivo numa aliança entre comédia e drama como resulta num excelente momento de cinema. A não perder.

«Uma Família Moderna», de Ferzan Ozpetek, com Ricardo Scarmacio e Nicole Grimaudo























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