domingo, 31 de outubro de 2010

Michael Clayton, Uma Questão de Consciência



Que acontece quando somos confrontados com o dilema da obrigatoriedade de cumprirmos com os nossos deveres profissionais e a dívida de lealdade para com um amigo que, ainda para mais, descobrimos ser detentor de uma verdade cruel que tem que ser contada ao mundo? Em primeira análise apelamos, creio eu, à nossa consciência. E ou a temos ou não, que é como quem diz ou agimos em nome do bem ou do mal. Não será tanto assim já que através da amostragem dos telhados de vidro de cada um o filme não procura mostrar heróis e vilões. E tem o mérito de não cair no erro de evidenciar a vida a preto e branco. Mas «Michael Clayton – Uma Questão de Consciência», a primeira incursão na realização por parte do brilhante argumentista Tony Gilroy, gira em torno desse vértice de legitimidade entre a moral e a própria legalidade dos (f)actos.



Esclareça-se no entanto que pese a trama se basear na relação de um poderoso escritório de advogados e um seu cliente que a ele recorre por se recusar a assumir a culpa que é sua na morte de quase meio milhar de pequenos agricultores, esta não se resume a uma história de advogados e seus dilemas tal como, por exemplo, é o conhecido filme dirigido pelo aqui actor Sydney Pollack, «A Firma». Não, este é um filme sobre o ser humano, sobre a consciência social e moral de cada um dos intervenientes na trama e as opressões que a mente sofre até que chega ao ponto de ruptura em que o único factor de redenção será a recuperação da liberdade individual até então tolhida pela profissão que se exerce. Quem, esporádica ou mais frequentemente, não a desejou já para si? A tal liberdade, a fuga para aquilo que nos parece algemar e regularizar apartando-nos do nosso eu?



Michael Clayton (um muito seguro George Clooney) é licenciado em Direito, mas na firma que representa como Consultor Especial ele é o homem certo no lugar certo sempre que se trata de resolver os problemas mais graves através da manipulação da lei e tudo feito de uma forma rápida e limpa. Pago a peso de ouro, o seu mundo - que já se encontra em desmoronamento à causa de problemas familiares - quase se despenha por completo quando o amigo, colega e prestigiado advogado Arthur Edens (Tom Wilkinson) morre em circunstâncias pouco claras. Michael começa então a compreender a gravidade dos contornos de um caso em que os ricos, os poderosos, mais uma vez se apoiam nos subterfúgios da lei para se eximirem de responsabilidades. E fazem-no porque podem pagar essa isenção de culpa. A partir deste momento, a narrativa embrenha-se na complexidade psicológica de cada uma das personagens em que não são esquecidas as motivações e constrangimentos que as condicionam.



Reclame-se a não exemplar originalidade da fita, mas reconheça-se a competência com que o filme é conduzido. Sobretudo ao nível das interpretações onde Tom Wilkinson (um perturbado advogado que só atinge a lucidez quando não se encontra medicado) e Tilda Swinton (uma dura e implacável Directora Jurídica que corta a torto indo mais longe que o simples esquecimento do direito e dos direitos do seu semelhante) demonstram toda a sua capacidade dramática logo seguidos de duas muito boas interpretações de George Clooney e Sydney Pollack. No fim, um prémio da realização para George Clooney e seus admiradores. Um close-up do actor à deriva pela cidade a bordo de um Táxi com 50 dólares de quilómetros para percorrer.



Em resumo, estamos na presença de cinema sério a merecer nota muito positiva.





Michael Clayton – Uma Questão de Consciência, de Tony Gilroy, com George Clooney, Tilda Swinton, Tom Wilkinson e Sydney Pollack

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