domingo, 31 de outubro de 2010

Os Irmãos Bloom









O admirável sonho dos Bloom





Neste mundo admirável mas por vezes tão esquivo e difícil, o maior privilégio a que alguém poderá aceder será o de viver a sua vida consoante a sonhou. E é precisamente desse sonho que nos fala o realizador Rian Johnson no filme que conta a história dos Bloom, dois irmãos órfãos que desde cedo tiveram que fazer pela vida. Johnson que em 2005 surpreendeu no Festival de Cinema de Sundance com «Brick». Bloom (Adrien Brody) é o mais sensível dos dois irmãos e aquele que verdadeiramente protagoniza as histórias escritas por Stephen (Mark Ruffalo), um escritor romântico feito argumentista de contos do vigário para os quais se socorre da inspiração de clássicos como Fiodor Dostoievski.



Apesar disso, a linha ténue entre realidade e ficção não é tão delicada assim e exerce sobre quem a segue uma pressão que pode tornar-se psicologicamente insustentável. É o que acontece a Bloom (Brody) que ensaia várias tentativas para fugir do mundo de fantasia e vigarice criado pelo irmão. Os dois decidem então executar um último golpe e para o fazer escolhem como vítima Penelope (a belíssima Rachel Weisz), uma herdeira solitária e tímida cujo maior hobby consiste em espatifar carros de alta cilindrada. Penelope é uma mulher excêntrica mas incrivelmente sedutora. Vem-se com o som das trovoadas, afoga-se em milhões mas sonha tornar-se contrabandista para ganhar tostões, e, claro, deste modo corre o grande risco de estragar os planos de Stephen (Ruffalo). Isto porque o sensível Bloom (Brody) não deixará de se apaixonar não resistindo ao poder de sedução de um exemplar perfeito e soberbo da bela casta feminina. Pelo meio dos três, os dois vigaristas e a potencial vítima, passeia-se a assistente japonesa dos irmãos Bloom. Ela que dá pelo nome de Bang Bang (Rinko Kikuchi), fala pouco (embora cante nos tradicionais bares de Karaoke de Tóquio) e é especialista em explosões.



O filme é divertido e as falas são de um modo geral inteligentes e de cariz profundamente psicológico. No entanto, o que mais se destaca deste projecto de Rian Johnson é a sua elevada ambição. Se não, vejamos: imaginemos que a todos nos é dada a capacidade de escrevermos o nosso próprio decurso de vida. Que pode haver de mais satisfatório? E se a dada altura esse sonho se desvanece por se tornar de impossível concretização nos for dada a possibilidade – triste mas extraordinariamente romântica – de tudo acabar, isto é, tal como o soldado no campo de batalha morrermos numa das nossas histórias? Ainda para mais sabendo que deixamos um importante legado: o de escrever para alguém que muito amamos um percurso final de vida pleno de felicidade. Poderá haver maior ambição? Creio que não.



Em resumo, apesar de algum desequilíbrio que se percebe, já que o filme não se aguenta por inteiro na dimensão enorme dos objectivos do seu realizador, o saldo final é claramente positivo. Sobretudo quando a história vem acondicionada num embrulho que transluz cinefilia por cada bocadinho da matéria com que foi composto. E se outra razão não houvesse para gostarmos deste filme, a sua capacidade de nos provar que as nossas vidas podem resultar muito mais daquilo que pensarmos para elas que o que na realidade acontece acaba por se tornar num motivo mais que suficiente para conquistar a nossa simpatia. Para além disso, em «The Brothers Bloom», no seu título original, Mark Ruffalo volta a ser o actor que tanto nos prometeu em «Podes Contar Comigo»(2000) e se Adrien Brody está uns furos abaixo daquilo que já nos ofereceu no passado, Rachel Weisz não sabe representar mal. E o seu sorriso, a sua beleza dócil, transporta-nos invariavelmente para a saudade daquele sorriso que nos faz, fez ou ainda fará sonhar. A caneta e o papel estão aí, a história a escrever está no âmago de cada um de nós.





«Os Irmãos Bloom», de Rian Johnson, com Mark Ruffalo, Adrien Brody, Rachel Weisz e Rinko Kikuchi






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