domingo, 31 de outubro de 2010

A ORIGEM









Vamos por partes

As referências

O futuro é já hoje. Aconteceu assim com «Matrix» (1999 e 2003), dos irmãos Wachowski, foi-o entretanto com «Minority Report» (2002), de Steven spielberg, já o tinha sido muito antes com «2001: A Space Odyssey» (1968), de Stanley Kubrick e acontece agora com «A Origem»(2010), de Christopher Nolan. E falar do futuro já hoje relembrando outras obras-primas do cinema, quer dizer duas coisas: que «A Origem» é antes de mais um ‘thriller’ de ficção-científica, elemento comum aos filmes citados, e que na sua inesgotável criatividade e brilhante talento narrativo, Nolan é um cineasta que assume as boas ideias como uma inevitável inspiração de obras anteriores de mestres do mesmo ofício. E este é um sinal de humildade e inteligência que só lhe fica bem.

A matéria de que se fez o filme

A trama do mais recente filme do fantástico realizador inglês não é fácil de explicar nem de seguir na tela. Pese o magnífico carácter visual do filme [isto hoje até é assim muito para o fácil de escrever, basta adjectivar], a narrativa vertiginosa que sobrepõe o pesadelo ao sonho e vice-versa, obrigam a uma atenção suplementar do espectador. Até porque a realização de Nolan é feita de pormenores magistrais que revelam uma produção irrepreensível. Ao nível do ‘casting’, do guarda-roupa, da montagem, dos efeitos especiais e, por que não dizê-lo, na capacidade que existiu para acompanhar a sofisticação do artífice Nolan.


A história

Cobb (um soberbo Leonardo DiCaprio), é um espião que rouba o maior dos tesouros: os segredos guardados no subconsciente dos homens e mulheres que lhes são extorquidos enquanto sonham. Para isso, Cobb possui uma equipa de colaboradores que funciona entre si com a precisão de um relógio suíço. No entanto, dadas as características delicadas do seu trabalho Cobb perdeu tudo o que lhe era querido. E para recuperar o seu mundo, vai ter que aceitar um trabalho que lhe é proposto por Saito (Ken Watanabe), um vilão à escala mundial, e que se afigura como a mais difícil missão que até então levou a cabo. Desta vez não tem que roubar uma ideia, não tem que conhecer um segredo, tem, isso sim, que implantar algo no cérebro de Robert Fisher (Cillian Murphy), um herdeiro multimilionário. Para o tentar, o espião Cobb vai contar com a importante ajuda de Ariadne (Ellen Page), uma estudante brilhante que é treinada para se adaptar ao mundo dos sonhos. É bom no entanto recordar que quando alguém adormece, e sonha, tanto pode contar com sonhos cor-de-rosa ou com um pesadelo de causar enormes dores de cabeça. E o subconsciente de Cobb é povoado pela memória de Lisa (Marion Cottillard), a sua mulher.


O sumo e as ofertas ao espectador

Em suma, «Inception», no seu título original, é um enorme desafio à nossa capacidade enquanto espectadores de cinema de absorvermos muita matéria psicológica retirada das profundezas da mente lançada num mundo alucinante durante o sonho. E é absolutamente gratificante perceber que num espaço muito ligado à percepção que nos surge do poder de racionalização do homem, é a emoção – a emoção, sempre a emoção, que comanda os níveis de motivação para se atingir algo ou impede a sua prossecução porque somos incapazes de viver sem, por exemplo, o amor. Nolan dá-nos ainda a possibilidade de revermos um actor que chegou a ser cabeça de cartaz no passado e que hoje, aos 61 anos, se apresenta como um homem extremamente diferente daquilo que o fez tornar-se conhecido do público. Falo de Tom Berenger mas é bom que se atente sobretudo no desempenho esplendoroso de Leonardo DiCaprio, ele que nem sempre viu o seu trabalho devidamente valorizado. Ainda assim, notem bem no que este rapaz cresceu como actor de cinema. E mesmo com tantas ofertas, a maior de Nolan neste filme tem a ver com os 147 minutos de muito e bom cinema. E a certeza do quão importantes são os nossos sonhos, do quanto eles são fundamentais para atingirmos algo que se define numa palavra que neste texto parece tão descabida mas que no fundo é àquilo a que tudo se resume: a felicidade.

«Inception», de Christopher Nolan, com Leonardo DiCaprio, Marion Cotillard, Ellen Page, outros








[É a esta gente, com Christopher Nolan à cabeça e outros na 'sombra', que se deve «A Origem»]


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