domingo, 31 de outubro de 2010

Expiação









Cecilia e Robbie.

Cecilia Tallis e Robbie Turner. Uma paixão maior que a vida, um amor que sobrevive a tudo. À mentira, à infâmia, ao afastamento, à dor, à guerra. Cecilia é a filha dos senhores de uma sumptuosa mansão na Inglaterra dos anos 30, Robbie é filho da governanta. Ele licenciara-se em medicina com o apoio do grande proprietário mas, para os membros da classe abastada, não passará nunca do filho da criada e jamais poderia ousar assemelhar-se a eles, aos escolhidos, juntar-se-lhes em igualdade de classe. No entanto, quis o destino que Cecilia e Robbie se apaixonassem perdidamente um pelo outro. E quando, após um pequeno desentendimento, Robbie escreve num pequeno pedaço de papel algumas palavras debruadas pelo fervor da paixão dizendo à sua amada que “anseia por beijar-lhe a cona húmida, a doce cona húmida”, é mesmo disso que se trata: de paixão, de arrebatamento, do desejo da carne motivado pela ebulição da alma. Levado, afinal, por um amor que lhe queima as entranhas.



Keira Knyghtley é Cecilia, James McAvoy corporizou Robbie e o londrino Joe Wryght realizou este emotivo filme a partir da obra escrita de Ian McEwan. Lá mais para o final da fita surgirá em todo o seu esplendor uma Vanessa Redgrave que vem para nos dar a triste notícia. Fá-lo de forma contida, serena, sorri com a tristeza de quem reconhece ter cometido um erro imperdoável enquanto criança. Na face enrugada da velha escritora, ela que causara danos irreparáveis quando era somente a pequena Briony Tallis irmã de Cecilia, já não há rastos de culpa. Naquele rosto, naquele olhar resignado, desgastado, existe apenas a consciência da transgressão cometida. De um pecado que acabaria por lhe ditar uma vida inteira em total…expiação.



Se quisermos ser inteiramente honestos na apreciação crítica, se esquecermos a comoção e olharmos com frieza a realização de Joe Wright deparamos com um filme imperfeito, com o desenrolar de algumas cenas que parecem emperrar o normal desenvolvimento da trama. Mas não, isso não é possível. Para quem Sente está terminantemente proibida a visão do filme desprendida de emoção. E a honestidade crítica não é para aqui chamada. Até porque há pormenores técnicos no filme dignos de registo, que requereram algum virtuosismo de processos. Refiro-me à montagem, ao manuseamento da câmara sobre os rostos perturbados ora pelo calor opressivo das paisagens campesinas de Inglaterra ora pelo testemunho das agruras da guerra. E depois há a banda sonora, fantástica. E há uma Kiera Knightley saída em roupagem íntima do interior de um lago qual Senhora das Águas. Felizes os contemplados com tão divinal visão. Obrigado, Senhor…Joe Wright.



«Expiação» é cinema clássico, digam-no. Sim, também tem pouco de original, não nos toca sequer pelo arrojo formal da sua concepção. O filme é mesmo uma adaptação, como já se disse, de um livro. Ou seja, parte da genialidade de alguém exterior ao cinema. Tudo isso é verdade. Mas a grande verdade, a verdade que interessa gritar, é que «Expiação» retrata com extrema sensibilidade a impiedade que vastas vezes se abate sobre os homens e as mulheres. Neste caso, ironicamente, a partir da história de um grande amor.



A não perder. De forma alguma.

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