domingo, 31 de outubro de 2010

Invictus







Mandela, o homem por detrás de uma nação





Nelson Mandela ficará para a história como um dos homens que melhor representou o sentido humanístico de alguém. Ele que optou por esquecer e perdoar o sofrimento que lhe foi infligido durante os 27 longos anos em que esteve preso numa cela diminuta em nome da arbitrariedade humana, para poder unir e salvar uma nação dos seus próprios temores e do espírito de vingança que entretanto se agigantava. A partir do livro do jornalista John Calin, em «Invictus» Clint Eastwood narra de forma sóbria mas brilhante o modo como o já então presidente da África do Sul resolve, em nome da salvação de um país, apoiar a selecção nacional de râguebi – que fora um dos maiores símbolos do ‘apartheid’ – numa tentativa de união entre brancos e negros. E se noutros filmes de Eastwood está patente uma forte descrença relativamente ao ser humano (vide «Gran Torino» ou «Million Dollar Baby», por exemplo) em «Invictus» existe uma fé inabalável naquilo de que os homens são capazes de fazer apelando, em derradeira possibilidade, à força que só os detentores de uma grande liberdade interior podem usufruir.



Apesar de se tratar de um filme de abordagem política, dada a história real que o suporta era impossível que assim não fosse, a realização de Eastwood preocupou-se muito mais com os factos ligados à relação entre Mandela (Morgan Freeman) e François Pienaar (Matt Damon) e, por sua vez, com o crescendo de força e união entre a selecção nacional de râguebi, da qual Piennar é o capitão, e brancos e negros desavindos até então. As questões pessoais e políticas ligadas a Mandela são tratadas muito ao de leve num filme em que o velho realizador procura falar mais ao coração do espectador que propriamente à razão como era seu timbre. E, neste aspecto, Mandela aparece aqui como um herói distante do modelo normalmente adoptado por Eastwood, já que se trata de um homem já não a afrontar um sistema mas sim a colar-se a ele, a alterá-lo é certo, mas acabando num triunfo conjunto: homem e sistema.



Falando especificamente de cinema, o filme torna-se emotivo a espaços mas de uma forma muito natural sem cair no sentimento gratuito. Por outro lado, sendo um cineasta representante do cinema clássico norte-americano, a narrativa adopta uma complexidade estrutural longe da biografia simples e muito menos se aproxima do filme épico ligado às questões desportivas. No entanto, é absolutamente épico e brilhante o crescendo dramático que Clint Eastwood atinge com as filmagens da final da Taça do Mundo de 1995. E não era tarefa fácil, uma vez que o resultado era conhecido em virtude do jogo ter acontecido na realidade e ser sobejamente conhecido o seu vencedor. Um último destaque para Morgan Freeman num filme notável a vários níveis: na sua interpretação do homem admirável que é Nelson Mandela, Freeman parece despojar-se completamente de si no objectivo claro de mostrar ao mundo o rosto da luta contra o ‘apartheid’ e um dos mais justos Nobel da Paz de sempre.



Quanto a mim, vou relembrar o pequeno ‘cameo’ de Clint Eastwood - ele que aparece na bancada a apoiar a equipa sul-africana na final da Taça do Mundo - no momento em que comprar a minha própria camisola da selecção que uniu um país e mostrou à aldeia global a raça e o querer dos homens justos.






«Invictus», de Clint Eastwood, com Morgan Freeman e Mat Damon


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