domingo, 31 de outubro de 2010

Relembrando o Calor da Discussão – Dogville

O Polémico Realizador Dinamarquês Lars von Trier

No meu regresso à cidade, olho o Cartaz de Cinema e constato que «Dogville» (2003), filme tido, por muitos, como obra maior na filmografia do cineasta dinamarquês Lars von Trier, se encontra em cena num Ciclo Especial de Cinema a decorrer algures no nosso país. O acaso leva-me a recordar como foi atacada, na altura, a minha clara rejeição do cinema que se observa em “Dogville”. Quer através de desagradáveis e-mails que recebi, quer em fóruns de cinema.



Não há que evitá-lo e acontece amiúde. Determinado filme vira objecto de culto para muitos quando se trata de matéria de repulsa (não, não exagero na expressão) para outros. Isto, pese a separação que deve ser feita entre o virtuosismo técnico de que Lars von Trier neste filme mais uma vez prova ser detentor (o que não nego, nem poderia) e o já recorrente em si (recorrente ou obsessivo?) tema de fundo que caracteriza o filme: a sua visão trágica, diria mesmo azeda, da essência humana. Não contente com isso, o cineasta dinamarquês ambientou essa sua doentia percepção do homem aos EUA numa época difícil para o seu povo (o 11 de Setembro de 2001 ainda estava bem fresco nas nossas memórias). A mim pareceu-me que von Trier não só destapara a ferida como se lançara sobre ela disposto a remexê-la, a causar dor. E isso, confesso, desagradou-me sobremaneira sabendo eu que nessa intenção nada havia de ingénuo.



Mas não foi só. É que curioso foi igualmente perceber que o tão exaltado brilhantismo da sua abordagem formal ao filme, que chegou a ser apelidada de cinema do futuro, assenta numa ‘mise en scène’ que tem tudo a ver com o teatro e quase nada com o cinema. Assim, o espectador é convidado a efectuar uma viagem que cinematograficamente o não leva a parte alguma e de toda a desintegração de valores a que assistimos sobressai apenas um egocêntrico Lars von Trier como figura máxima desse existencialismo negativista.



Apesar de tudo, «Dogville» não é um filme para se odiar. Nicole Kidman – sobretudo ela, Ben Gazzara e companhia acabaram por retirar, com as suas estupendas interpretações, mais esse pequeno prazer ao controverso realizador que viu gorada a sua subjacente provocaçãozinha. Afinal, prova-se que ao contrário do provérbio também há bens que vêm por mal.





[Esclareça-se que nada me move contra o senhor; Ondas de Paixão (1996) do mesmo Lars von Trier, até faz parte do lote dos meus filmes preferidos.]

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