domingo, 31 de outubro de 2010

Omissão





Hoje, vindo de viagem do Porto, encontrei a L. na Àrea de Serviço da Mealhada. Ela viu-me primeiro e chegou-se a mim com um ar expansivo e sorriso de orelha a orelha vendo-me furibundo por ter apanhado mais uma molha desde o carro até ao bar do local. Lembro-me que tivemos em tempos uma paixoneta um pelo outro. Eu sentira-me atraído pelos seus cabelos lisos, castanhos claros, pelo seu sorriso cativante e, por que não dizê-lo, porque tinha as pernas mais bonitas da nossa turma. Ela suponho que se tivesse apaixonado por mim num dia como o de hoje, de chuva, em que carregado de livros escorreguei num lamaçal no pátio do Liceu e cheguei à sala de aula completamente encharcado de água e lama ouvindo ainda um raspanete do professor por ter estragado o livro da disciplina a que dava aula. São insondáveis os desígnios da alma humana e a pena que senti estampada no rosto dela transformara-se em amor. Eu não me importei com o facto, confesso. Mantinha a mesma beleza jovial e uma tão positiva quanto assombrosa atitude perante a vida. Conversámos durante alguns minutos. Divorciara-se há poucos meses, disse-me, porque se tinha apaixonado por outro tipo. Sem que eu lhe perguntasse o que quer que fosse, garantiu-me que apesar disso nunca tinha mentido ao ex. Até porque nos últimos meses de casamento falavam muito pouco. Ao ouvi-la, não pude deixar de meditar em algo que um dia li num dos livros de Simone de Beauvoir. Sim, talvez ela não lhe tivesse mentido. Mas certamente que durante algum tempo fugiu de lhe dizer a verdade.






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