terça-feira, 12 de outubro de 2010

E.T. - O EXTRA TERRESTRE


     




DO CÉU CAIU UMA ESTRELA
     
      Ele aí está de regresso. Com som remasterizado da fantástica banda-sonora do mítico John Williams, com algumas pequenas reformulações de carácter político – nos diálogos e não apenas, tendo sido mesmo substituídos alguns equipamentos/apetrechos da edição original – , com cerca de dez minutos mais de imagens inéditas e tratamento digital de outras com direito a arranjos no rosto do E. T. (“noblesse oblige” dos novos tempos, certamente), ele regressou. No entanto, apesar das alterações feitas que mais não produzem que a demonstração inequívoca da passagem do tempo, este continua a ser – e é ele quem está de regresso – o “nosso”, o inigualável E. T.. Aquela inconfundível criatura que passa por ser a figurinha grotesca mais amada à face da Terra, ainda que vinda de uma galáxia distante. Uma criatura adorável de cabeça enorme, albergando em si mesma uns olhos grandes, carregada sobre um pescoço que estica vindo de um corpinho disforme onde se destaca um dedo de pontinha luminosa. «E. T. – O Extra Terrestre» é uma obra-prima fantástica e imensamente popular, tendo-se revelado um estrondoso êxito aquando da sua estreia no já longínquo ano de 1982.
     
      (em tempo de Oscars refira-se, como curiosidade, que «E. T.» foi, na cerimónia do seu tempo, derrotado nas principais categorias e em número de prémios por «Gandhi»; confirme-se pois que pouco terá mudado desde então neste aspecto da atribuição dos mais famosos galardões do cinema, pois, quer se queira quer não, estes nunca poderão ser consensuais e deixarão sempre, e inevitavelmente, que fique no ar uma certa sensação de injustiça;)
     
      «E.T.» é, assim, uma das maiores obras de Steven Spielberg, sendo até a preferida do realizador, um filme que aborda vagamente o género da ficção-científica, mas que acaba por ser, concordo em absoluto com quem o defende, um dos mais emocionantes melodramas da já muito vasta e rica história do cinema. A história do filme mergulha muito a propósito e com bastante sensibilidade num clima de perda com sentido de extensão, pode-se dizer, universal. Porque o E.T. é um ser de outro planeta – um cientista, provavelmente –, involuntariamente esquecido na Terra quando a sua nave é obrigada a uma fuga precipitada depois de surpreendidos, E.T. e os seus iguais, a recolherem amostras da nossa flora. E porque o pequeno Elliot (Henry Thomas) é uma criança que vive igualmente a angústia do abandono, neste caso do abandono do lar por parte do pai recentemente divorciado da mãe e a viver no México. Elliot e a família, a mãe (Dee Wallace), o irmão mais velho (Robert McNaughton) e Gertie (Drew Barrymore) a pequena irmâzita, vivem algures na Califórnia. Impelidos, quiçá, por este ambiente de cumplicidade e fragilidade emocional, Elliot e o E. T. desenvolvem entre ambos uma fortíssima relação de amizade, com igual partilha física da dor e do júbilo, onde as acções empreendidas são invariavelmente veiculadas numa perspectiva de inocência e pureza infantis.
     
      Deve realçar-se que não existe verdadeiramente uma face do mal neste filme. Mesmo quando Elliot protege o seu amigo E.T. do mundo dos adultos, o mal que a estes lhes é atribuído relativamente a E.T. é simplesmente o de o quererem analisar e estudar dentro de uma suposta atitude científica benéfica para a nossa sociedade. Pungente em muitos momentos mas repleto de um fascinante sentido de humor, o filme assenta numa invariável luminosidade onde alguma obscuridade, a existir, se prende com os ambientes mais místicos da temática de fundo e recorrente do imaginário de outros mundos, do mundo de E. T.. E quando o desenvolvimento do argumento permite alguma sensação de dor através da omnipresente impressão de perda e do vazio afectivo que esta motiva, logo a atenuamos na candura dos rostos infantis que reflectem uma doce inocência (a pequenina Drew Barrymore é fantástica neste particular aspecto). Aliás, outro dos pormenores de curiosidade da revisitação deste clássico para crianças e adultos, é observarmos as diferenças físicas do elenco – crianças de então, adultos de hoje. Mas a maior curiosidade residia em percebermos se, passados 20 anos, o filme perdera alguma da sua espantosa dimensão emocional. E, recordando-me com nostalgia da minha presença na sua estreia de há duas décadas e revivendo agora essa experiência fantástica, é gratificante poder constatar que nada se alterou. Tal como há 20 anos, e sendo eu hoje um adulto, não é que os dois sacaninhas, Elliot e E.T., me pregaram uma partida e me voltaram a humedecer o olhar?


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