quarta-feira, 13 de outubro de 2010

HARRY POTTER E A PEDRA FILOSOFAL





      A HISTÓRIA DE UMA POÇÃO MÁGICA PARA O SUCESSO
     
      Imagino que a primeira pessoa a sentir-se esmagada ao ver este filme seja a escritora J. K. Rowling. Porque se sente, e percebe muito bem, os efeitos emocionais que o filme despoleta em cada criança que o vê. Mesmo naqueles adultos que, como eu, se sentiram viajar através do tempo, viajar até à sua infância hoje perdida no decurso natural da vida. Até tempos de pura magia, de descoberta, de sonhos. Mesmo aqueles sonhos utópicos que têm lugar apenas na imaginação de uma criança, que nascem de uma inocência própria da idade. Uma idade onde cada nova descoberta surge numa deliciosa áurea de encantamento, onde cada história que nos era contada pelos mais velhos ao calor de uma lareira acesa, ao som do crepitar da lenha ardendo, era transportada para noites de insónia observando o vazio da noite, a magia da escuridão. Imagino que a escritora autora desse estrondoso êxito literário que é sem dúvida «Harry Potter», levada pelas suas próprias emoções, num misto de orgulho e incredulidade perante a importância do que a sua escrita desencadeou por toda a parte, se tenha mesmo questionado: “Como é possível tudo isto, como foi que tudo isto aconteceu? Meu Deus, isto saiu do meu livro e é sobre o que escrevi que se debruçam os sonhos mais surpreendentes destas crianças!” E tem razões de sobra para o fazer. Os seus livros viraram fenómenos de venda e este filme dá vida em som e imagens às fantásticas aventuras de um menino órfão que é convidado para frequentar o colégio Hogwarts para feiticeiros predestinados.
     
      Não li nenhum dos livros de J. K. Rowling. Tentei fazê-lo, tentei perceber o fenómeno. Desisti passadas algumas páginas entre poções mágicas e estranhas figuras. Sou pois, e cingindo-me apenas à parte literária de Harry Potter, muito mais que – dada a minha condição – um desinteressante “muggle”, um “muggle” desinteressado. Depois de ter visto o filme, e observando algumas reacções a ele por parte de quem leu o livro, suponho que isso acabou por jogar a meu favor na reacção própria obtida pelo que vi. É que o filme tem um argumento sólido e recheado de tudo aquilo que povoa o imaginário dos mais pequenos, não se esquecendo nunca de separar as águas do Bem e do Mal (essencial num filme com este tipo de público alvo, embora a ser visto por todos) e não abdicando na mesma medida de uma evidente faceta educativa. Em termos de efeitos especiais é um produto de alta competência, sem cair no exagero a que a génese mágica da história que narra poderia facilmente levar relativamente às figurinhas e situações criadas. Por outro lado, o trabalho dos actores é altamente competente na maioria dos casos e vai mesmo mais longe no que se refere a Ruppert Grint (Ron Weasley, o menino pobre e com muitos irmãos, pequeno feiticeiro amigo de Harry e que imprime por si só muito do bom humor do filme) e ao bom e carinhoso gigante que sempre falava de mais Hagrid (A . Robert McMillan). Aliás, neste particular das personagens criadas é de destacar a forma fantástica como se identificam com o público alvo. Um exemplo feliz poderá ser o da pequena Hermione Granger (Emma Watson). Quem não se lembra de alguma vez ter tido uma coleguinha que tinha tanto de bonitinha como de nariz algo para o empinadote (se é que me faço entender), e que tudo lia e tudo sabia deixando-nos sempre ficar mal nas chamadas ao quadro!? E o pior é que mesmo em termos românticos tínhamos sempre a concorrência de toda a vertente masculina da sala na luta pela sua atenção! Se juntarmos a tudo isto a forma esplêndida como se ergueram cinematograficamente os ambientes e cenários vividos no interior do Colégio de Magia de Hogwarts e a muito boa caracterização das tão díspares criaturas que o povoam, então percebemos que as más reacções ao filme se deverão, em grande parte, à insatisfação relativamente à transposição (ou não ) para o cinema de detalhes do livro.
     
      Quer-me parecer, e pelo pouco que li dos livros de Rowling, que um dos maiores méritos do realizador Chris Columbus reside na forma credível e inteligente como transportou para o filme algumas das partes mais fantasiosas da história em livro. No entanto, e na minha perspectiva, o pormenor que atribui ao filme uma dose enorme de sedução – e isto não é fácil de explicar, pela hipotética dúbia interpretação que carrega – é o facto de poder criar medo em muitos momentos. Este é, arrisco mesmo, quase um filme de terror para crianças e essa faceta, aliada ao mundo mágico da vivência da narrativa, provoca uma maior excitação no pequeno espectador não permitindo nunca que o filme acabe na sua mente por alturas do genérico final. A verdade é que acredito que muitas das imagens do filme, como aquelas histórias contadas ao calor de uma lareira em noites longas de Inverno, os acompanharão por bastante tempo.
     
      Em suma, sem ser um filme inovador, é um filme que transborda competência e que consegue explicar a quem não leu os livros as razões do sucesso das criações literárias de J. K. Rowling. Como já foi dito e talvez perante a própria estupefacção da escritora que o criou, e mesmo que muitos de nós continuemos com alguma dificuldade em o perceber (e nem consigamos sequer ler os livros), Harry Potter tornou-se num feiticeiro de verdade ao imprimir magia aos sonhos de muitos dos mais pequenos. E Chris Columbus criou um produto cinematográfico à altura desse estatuto, não deixando ficar mal toda esta espantosa máquina promocional que fez com que este filme estreasse, só no nosso país, em 63 salas de cinema.

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