quarta-feira, 13 de outubro de 2010

HOMEM ARANHA





      HERÓI ACIDENTAL
    
      Com estreia em 94 salas de cinema no nosso país, aí está a segunda mais bem sucedida B.D. da Marvel, só ultrapassada nesse particular por «X – Men» . A estreia de «Homem Aranha», nascido em 1962 sob a paternidade de Stan Lee e Steve Ditko não sendo no entanto obrigatório que um fosse a mãe e outro o pai, possui ainda a acrescida curiosidade de só num novíssimo mas já famoso multiplexe estrear em 6 (!) diferentes salas. Não se admirem pois, caso visitem por estes dias o referido empreendimento no intuito de assistirem a uma sessão de cinema, se eventualmente forem acometidos da pertinente incerteza entre irem ver o «Homem Aranha», ou... o «Homem Aranha». Esta adaptação cinematográfica esteve a cargo de um homem, Sam Raimi, com um percurso curricular inicial bem distante deste género popular, mas que aqui provou igualmente uma especial vocação para o negócio. O filme, refira-se, é já um dos maiores sucessos comerciais do cinema americano.
     
      Entrando em alucinação (defenderão alguns), a história aborda, em termos humanos e numa leitura distinta do habitual mas possível, a questão da solidão como fatalidade de um destino pessoal. É que o rapaz que vira aranha e só depois homem começa por ser um miúdo tímido, frágil e vulnerável com um só amigo e acaba por, mais tarde, voltar à adversidade da solidão por obrigatória mas altruísta renúncia. Independentemente deste facto, o que é indiscutível é que em todo o filme se sente a pena de David Koepp por motivo do seu bem identificável cunho pessoal na adaptação argumental da B.D. para o cinema, uma vez que, ao contrário do que se tem visto noutras obras paralelas, o ênfase é dado em grande parte ao lado humano das personagens. Isso e a forma como se privilegiam aspectos ligados à evolução de Peter como um jovem vulgaríssimo, o anti-herói mesmo, que vai crescendo em termos humanos em resultado de acontecimentos que o afectam até se elevar ao estatuto de super-herói, fazem deste um filme que procura fugir ao estereotipo habitual. Por outro lado, existem alterações claras à história original no sentido de se exercer a necessária adaptação aos nossos dias. Repare-se que a aranha radioactiva que pica Peter é agora uma aranha modificada geneticamente. Mas não só, Koepp acaba por não esquecer como é importante o papel crítico do cinema mais moderno sendo que nesse aspecto a imprensa, e a forma como esta pode manipular a informação, assumem papel de destaque no filme.
     
      Quanto a Sam Raimi, apesar de haver um claro decréscimo da qualidade da narrativa consoante o filme se vai aproximando do seu final pode dizer-se que gere com algum saber os diferentes conceitos de realidade e fantasia que uma história do tipo sempre acarreta. Não conseguiu evitar também ele as movimentações a que obriga o seu herói retiradas a papel químico de Matrix, mas, pior que isso, deixa que por diversos momentos os diálogos demasiado melosos ameacem algum constrangimento no espectador. Relativamente ao “cast”, Tobey Maguire revela-se uma escolha acertada de Raimi para o papel, uma vez que as suas discretas características pessoais podem associar-se em muito ao carácter de anti-herói de Peter Parker. E se Kirsten Dunst raramente foge a um estatuto menor na narrativa, já Willem Dafoe compõe um interessante Norman Osborne. Dafoe, sem ser exageradamente histriónico, é igualmente um “goblin” cuja vilania é deliciosamente temperada com um riso sarcástico, é certo, mas que revela o quanto de psicótico a personagem encarna.
     
      Enfim, no deve e haver final que nos divide entre o Suficiente + e o bom - , faça-se justiça e constate-se que a intensidade dramática que o filme em momento algum alcança acaba por ser contrabalançada pelo facto desta adaptação de uma B. D. ter conseguido fugir à ditadura dos efeitos especiais sendo que a sua estética plástica se manteve (quase) sempre ao serviço da narrativa.


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