terça-feira, 12 de outubro de 2010

A MÁQUINA DO TEMPO

     

     



O FUTURO CRIADO SOBRE UM PASSADO IMPERFEITO
     
      Ainda que se mantenha uma simples pretensão envolta em fantasia e utopia, viajar através do tempo continua a ser uma das maiores aspirações do homem. E o cinema, como fabulosa máquina de sonhos, persegue a sua muito natural ambição de desafiar convicções instaladas sobre para onde se dirige o destino da humanidade. Socorrendo-se de efeitos especiais que buscam um contido deslumbramento visual, ainda que se justificasse um maior apetite criativo neste capítulo, «A Máquina do Tempo» é uma adaptação da obra de um dos escritores cuja bibliografia mais tem sugerido versões cinematográficas. Com efeito, por motivo do seu estilo muito visual e da sua visionária descrição futurista, H.G. Wells escreveu ainda outras obras que têm vindo a ser importante objecto de atenção por parte do mundo da 7ª arte, mesmo que somente por simples derivações nelas baseadas. Exemplos mais importantes disso mesmo serão «O Homem Invisível», «A Ilha do Dr. Moreau» e «A Guerra dos Mundos». Este «A Máquina do Tempo», possui ainda a particularidade de ter sido realizado por Simon Wells, um homem que vem do cinema de animação. Mas a curiosidade maior reside no facto de Simon Wells ser igualmente bisneto do desaparecido (1866 – 1946) escritor inglês.
     
      Alexander Hartdegen(Guy Pearce) é um cientista algo lunático que, ironicamente, encontra a sua maior motivação para levar a cabo o invento que lhe irá permitir viajar no tempo numa tragédia pessoal que o abala emocionalmente. Deve dizer-se que, até como busca de obtenção de uma maior plausibilidade especulativa, neste tipo de histórias o mais comum é o regresso de um elemento da época retratada ao passado ou a visita até aos nossos dias de seres vindos do futuro. E é, por isso mesmo, altamente meritória a forma como se justifica a viagem até um futuro tão distante, como 800 000 anos certamente indiciam, deste homem que vivia em 1890. Ele, na verdade, viaja primeiramente até ao passado numa dramática tentativa de o alterar e no sentido de evitar a referida tragédia que lhe sacudira rudemente a alma. Mas, ao ver frustrados esses intentos, Hartdegen decide guindar-se ao futuro para exactamente diligenciar perceber o porquê da inviabilidade dessa alteração de destinos. No entanto, vítima de alguns acidentes de percurso, o cientista acaba por cair numa era absolutamente longínqua. Uma era onde (sobre)vivem duas raças: os predadores Morlock e as suas presas, os Elói.
     
      («A máquina do Tempo» é um daqueles filmes que viram o seu final alterado e objecto de novas filmagens em consequência dos funestos acidentes de 11 de Setembro em Nova Iorque; nas cenas não incluídas no filme, a Lua destruída desabava em fragmentos sobre Manhattan;)
     
      Apesar de tudo, mesmo com a exploração de um futuro a roçar o absurdo como resultado do acumular de erros durante milénios de existência humana, o filme de certa forma desilude dois níveis de expectativas: porque mesmo observando um futuro feito de horrendos cambiantes no que concerne à dividida essência do ser humano, o que quase nos faz desejar atingir um nível ascético da nossa vida, não é suficientemente consistente no desenrolar da narrativa; e porque, em questões que se prenderão com efeitos visuais que a tecnologia moderna permite, se sente que não se aproveitam satisfatoriamente essas vantagens relativamente aos recursos criativos que uma obra escrita em 1895 já por si facilitava. Por outro lado, algumas das cenas supostamente tendentes a criar um maior fascínio junto do espectador, são recebidas com alguma frieza. Exemplo disso mesmo é a cena em que Hartdegen se opõe a Uber-Morlock (Jeremy Irons). Esta particular cena serve, igualmente, como suporte para a ideia que fica da prestação inconstante de Guy Pearce (que é, sem dúvida, um actor em clara ascensão na sua carreira). Pearce não conseguiu imprimir à sua personagem a dimensão dramática exigida em determinadas sequências do filme.
     
      Enfim, a máquina que H. G. Wells criou e nos legou através da leitura dos seus livros, acaba por, neste filme realizado capazmente pelo seu bisneto Simon, atingir o efeito para a qual foi criada: faz-nos, pelo menos durante os 96 minutos que dura o filme e embora em classe turística, viajar através do tempo. E essa já é uma virtude e motivo mais que suficiente para justificar uma ida à sala de cinema.

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