domingo, 31 de outubro de 2010

Pesadelo






«- Quero contar-te tudo.

Albertine levantou ternamente a mão como que impedindo-o, mas ele agarrou-a e segurou-a na sua, com um olhar que simultaneamente questionava e implorava. Então ela acenou-lhe consentindo e Fridolin iniciou o seu relato.»



«- Que é que devemos fazer, Albertine?

Ela sorriu por instantes, depois respondeu:

- Acho que devemos estar gratos ao destino por termos saído ilesos dessas aventuras, tanto as reais como as que sonhámos.»






in A História de um Sonho, de Arthur Schnitzler

















O livro e o filme





Há quem defenda que Arthur Schnitzler (1862 – 1931) foi o escritor que melhor descreveu os fantasmas do inconsciente, nomeadamente no que se refere às tensões sexuais próprias dos casais presos a uma conduta comportamental que supostamente é devida nos relacionamentos amorosos. Ao reler esta obra do escritor austríaco que rivalizou com Freud na teorização das pulsões eróticas quando reprimidas, não pude deixar de confirmar dois importantes aspectos: o quão actual o tema ainda se encontra, relembre-se que o livro foi publicado em 1926, e a extraordinária argúcia de Stanley Kubrick, verdadeiro psicólogo das imagens, na adaptação do livro ao cinema («Eyes Wide Shut», 1999). E são igualmente duas as interrogações que ficaram a pairar-me na mente quando terminei o último parágrafo do texto: até que ponto os casais se privam da consumação de desejos inconfessáveis para manter estáveis os seus relacionamentos e, por outro lado, mesmo um pouco em contraposição a isto, como seria mais feliz a vida das pessoas se a sociedade não os agrilhoasse a convenções e obrigações que de outro modo seriam tidos como absolutamente naturais?













No fabuloso filme de Stanley Kubrick, a cena final é transferida do quarto de dormir para uma loja de brinquedos. O apaziguamento da personagem de Nicole Kidman às confissões do marido é similar à do livro, mas quando a personagem de Tom Cruise questiona a mulher sobre se ficariam juntos para sempre, esta responde-lhe, grosso modo:





«- Para sempre? Não utilizemos essa palavra, assusta-me. Mas amo-te e há uma coisa que precisamos fazer urgentemente.



- Que é…? – Interroga Cruise.



- Foder.»]




In
De Olhos Bem Fechados (1999), Stanley Kubrick





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