sexta-feira, 15 de outubro de 2010

YOUNG ADAM






VIDAS SEM ESPERANÇA
     
      Mesmo contando com as boas representações de Tilda Swinton e Ewan McGregor, este filme do realizador escocês David Mckenzie falha onde mais queria acertar: nas desmesuradas ambições de um argumento que nunca demonstrou ter pernas para o salto que pretendeu dar.
     
      Esta co-produção franco/britânica escrita e dirigida pelo escocês David Mackenzie e adaptada de um livro de Alexander Trocchi assenta numa história tão cinzenta quanto a vida das personagens que a habitam. Mas nem sequer se deve a esse pormenor de cinzentismo, que a fotografia do filme faz questão de sublinhar, alguma estupefacção pelo que nos é desde logo dado a observar. O pasmo, esse, talvez principie a manifestar-se quando observamos Joe Taylor (Ewan McGregor), um homem jovem, aparentemente culto e inteligente, ainda para mais com boa pinta, a levar uma vida miserável como empregado de uma barcaça que faz o transporte de carvão entre as cidades de Glasgow e Edimburgo. O barco é propriedade de Ella (Tilda Swinton) e de Les (Peter Mullan), o seu marido. Para além de local de trabalho, a embarcação serve ainda de residência aos três e ao pequeno filho do casal. Estamos então nos anos 50, em plena Escócia, e um dia Joe e Les pescam das águas geladas o cadáver de uma jovem desconhecida. A partir daqui, o filme divide-se entre o dia-a-dia da tripulação do “Lady Eve”, o avançar da investigação policial em torno da descoberta do cadáver da mulher e as memórias em ‘flashback’ de Joe na sua relação com Cathie (Emily Mortimer), uma antiga namorada. Mas as dúvidas quanto às causas que levaram ao afogamento da desconhecida adensam-se.
     
      Enquanto Les consulta todos os jornais para saber se o seu nome é focado como descobridor do corpo, o aparente desinteresse de Joe pela matéria é compensado pelo calor fedorento do corpo de Elle onde mergulha sofregamente enquanto o marido vai jogar setas para um bar. Curiosamente, a cada mulher que aparece na trama o único intuito parece ter a ver exclusivamente com a forma fácil como cede aos encantos deste intelectual perdido para a cultura em prol do transporte fluvial de carvão. Seja a espalhafatosa irmã de Ella, recentemente viúva, ou a dona da casa onde irá viver mais tarde que lhe presta alguns favores sexuais enquanto o marido sai para o turno da noite. Antes disso, com o evoluir da trama, vai-se fazendo luz sobre a identidade do cadáver retirado do mar. Vão-se igualmente percebendo as razões do desinteresse inicial de Joe pela matéria à medida que se deslindam os contornos da sua relação com Cathie. Entretanto, um honrado chefe de família vai sendo julgado pelo assassínio da mulher desconhecida à altura em que fora repescada das águas. Desse modo, e mesmo com Joe a lutar no escuro contra tal, a lei parece rejeitar as teses de acidente ou suicídio.
     
      Pese alguma demonstração de bem-fazer por parte de Mackenzie ao nível da estruturação de um filme que é tudo menos simples nas suas opções conceptuais, é nítido o exagero de registos por parte do escocês quer em termos da sua realização pesada quer das tropelias de um argumento que se perde na sua desmesurada ambição. Com efeito, a trama policial que decorre paralelamente à acção principal revela-se incipiente e bastante desinteressante não contribuindo assim para o enriquecimento da narrativa. Já a composição psicológica das personagens, nomeadamente Ella e Joe, consegue fugir aos estereótipos habituais quer na relação de amantes desprendidos das razões do coração que se desenvolve entre ambas (as personagens) ou mesmo na forma igualmente desapaixonada como pautam as suas vidas. É como se a claustrofobia das existências a bordo de uma embarcação de transporte de carvão, sem um mínimo de condições de higiene e bem-estar, funcionasse como um factor de opressão que leva à total desagregação das boas regras de conduta de Ella e Joe. E nesse aspecto, quer a interpretação de Tilda Swinton, pela forma como se anula enquanto expressão física, quer de Ewan McGregor, no que diz respeito ao negar da sua personalidade intelectual, são absolutamente relevantes para que o filme não se perca totalmente na obscuridade existencial que o seu autor pretendeu imprimir-lhe. Isso e a música melancólica de David Byrne.

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